A ESTRUTURA EM LATOSSOLOS VERMELHOS DE ROCHAS ERUPTIVAS NA BACIA HIDROGRÁFICA PARANÁ III - BHPIII

Gustavo Ribas Curcio1; Annete Bonnet2

 

Dentro das paisagens sobre rochas eruptivas da BHP III, o Latossolo Vermelho (Figura 1) é o solo com a maior ocupação territorial. Esta classe possui trofia variável no horizonte B – eutrófico e distrófico – além de elevada profundidade e textura muito argilosa – acima de 700 g.kg-1.

Os Latossolos ocupam relevos de conformações amplas e suaves com predomínio de baixas classes de declividade – plano (0 – 3 %), suave ondulado (4 – 8 %) a ondulado (9 – 20 %). Possuem posicionamentos nas encostas muito variáveis – do topo até o terço inferior da paisagem, tanto em rampas com formas convexas-côncavas-convergentes, convexas-divergentes ou mesmo convexo-retilíneas (Figura 2). As condições citadas conferem um alto potencial de produção, proporcionando alto rendimento para os sistemas produtivos.

Figura 1 - Latossolo Vermelho Eutroférrico típico.
Figura 1 - Latossolo Vermelho Eutroférrico típico.

 

Figura 2 - Latossolo Vermelho em rampa convexa-retilínea.
Figura 2 - Latossolo Vermelho em rampa convexa-retilínea.
 

Em função de seu elevado grau de desenvolvimento pedogenético, os Latossolos da bacia têm como predominante a caulinita na fração argila com presença de óxidos o que, em condições naturais, lhe confere uma estrutura granular diferenciada em seu horizonte subsuperficial diagnóstico – Bw (Figura 3).

 

Figura 3 - Estrutura granular de horizonte Bw de Latossolo Vermelho.
Figura 3 - Estrutura granular de horizonte Bw de Latossolo Vermelho.

 

 

Sob condições preservadas não é incomum se deparar com estruturas granulares do tipo grumosa no citado horizonte, ou seja; as unidades estruturais possuem elevados percentuais de poros com alto grau de conexão, típica dos Latossolos. No horizonte superficial, mais sujeito a modificações devido aos usos constantes de implementos e máquinas agrícolas, é onde se tem as maiores mudanças de estrutura, sejam por desagregação ou por compactação.

Como se sabe a estrutura é uma propriedade interdependente de vários outros fatores e é fundamental para os morfologistas procederem ao reconhecimento, caracterização e classificação do solo. Em condições naturais, a estrutura consiste na manifestação de padrões de arranjamento estáveis entre as partículas de areia, silte, argila (com ou sem a matéria orgânica) e podem ser facilmente mutáveis.

A forma e a intensidade de agregação desses elementos são muito importantes para a formação de agregados ou peds, nos quais se tem acondicionados os espaços porosos – inter e intra-agregados - ocupados por ar e água. Como se sabe, a manutenção das estruturas granulares nos Latossolos é vital para que se possa ter boa capacidade de aeração (incorporação de O2 e saída de CO2), fácil penetração de raízes, boa infiltração de água, redistribuição e retenção de água entre os horizontes, entre outros benefícios. Por conseguinte, a manutenção de estruturas com grande quantidade de poros conectáveis é vital para minimizar os processos erosivos.

As ações de cultivo do solo, independentemente do grau de tecnologia e manejo empregado, acabam por afetar as estruturas originais superficiais em maior ou menor intensidade, incorrendo em perdas quantificáveis vultuosas – menor produtividade, e de difícil mensuração financeira, a exemplo, erosão.

Durante as ações de mapeamento na BHP III os técnicos do PronaSolos-PR têm encontrado comumente fortes alterações estruturais nos Latossolos Vermelhos – encrostamento e compactação.

O encrostamento é uma camada mineral endurecida, quando seca, com espessura que varia de poucos milímetros a alguns centímetros na superfície do solo, resultante da quebra das unidades estruturais superficiais do solo (desagregação), com consequente rearranjamento de partículas (Figura 4). Esta desagregação causa um selamento dos poros, com a subsequente formação de estruturas laminares de baixa permeabilidade e restrita aeração (Figura 5).

Figura 4 - Presença de encrostamento em Latossolo Vermelho.
Figura 4 - Presença de encrostamento em Latossolo Vermelho.

 

Figura 5 - Estrutura laminar na superfície de Latossolo Vermelho.
Figura 5 - Estrutura laminar na superfície de Latossolo Vermelho.
 

A intensidade de manifestação deste processo é decorrente de uma interação de fatores, tais como variação textural, baixas taxas de carbono presentes nos agregados, trânsito de máquinas e implementos agrícolas, sobretudo, exposição da superfície do solo ao impacto da gota da chuva em função da falta de cobertura do solo – palhada ou cultura agrícola.

Na BHP III há uma diferença bastante acentuada na formação de palhadas identificada durante as ações de levantamentos de solos. Abaixo dos 400 metros de altitude, em função das temperaturas mais elevadas, há um forte declínio da quantidade de palha identificada na superfície dos solos deparando-se, portanto, mais frequentemente com o encrostamento superficial (Figura 6). Portanto, essas áreas são mais críticas para a geração de crostas e devem ter manejos mais específicos para evitar sua formação, dentre esses uma boa cobertura de palhada sobre o solo (Figura 7).

Figura 6 - Lavoura com pouco resíduo de palhada.
Figura 6 - Lavoura com pouco resíduo de palhada.

 

Figura 7 - Boa cobertura de palhada sobre o solo.
Figura 7 - Boa cobertura de palhada sobre o solo.
 

A operação de tradagem, ação extremamente frequente durante o mapeamento de solos, identificou facilmente o encrostamento (Figura 8). Além da maior dificuldade para a penetração do trado no solo, outra forma de identificar a crosta é tracionar o trado levemente para cima depois do “caneco” estar integralmente dentro do horizonte superficial. Ao menor movimento de tração observa-se o craquelamento da superfície do solo, muitas vezes, em forma radial (Figura 9).

Figura 8 - Crosta superficial em Latossolo Vermelho textura muito argilosa.
Figura 8 - Crosta superficial em Latossolo Vermelho textura muito argilosa.

 

Figura 9 - Encrostamento superficial com craquelamento radial em Latossolo Vermelho.
Figura 9 - Encrostamento superficial com craquelamento radial em Latossolo Vermelho.
 

Nos Latossolos Vermelhos da BHP III sob lavoura também foi identificada com muita frequência a presença de camadas compactadas, fato onde se evidencia grandes volumes de solo com profunda alteração da estrutura original dos horizontes superficiais. As figuras 10, 11, 12 e 13 ilustram algumas diferenças de estrutura em horizonte A de Latossolos Vermelhos.

Figura 10 - Estrutura granular de horizonte A de Latossolo Vermelho em floresta nativa.
Figura 10 - Estrutura granular de horizonte A de Latossolo Vermelho em floresta nativa.

 

Figura 11 – Estrutura pouco alterada de horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
Figura 11 – Estrutura pouco alterada de horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
Figura 12 - Estrutura compactada de horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
Figura 12 - Estrutura compactada de horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.

 

Figura 13 - Forte compactação do horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
Figura 13 - Forte compactação do horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
 

Trata-se de um processo em que se verifica a alteração dos tipos e tamanhos das unidades estruturais, com forte perda da porosidade do solo – aumento da densidade do solo.

A maioria dos Latossolos Vermelhos da mencionada bacia encontram-se com forte grau de compactação, algumas vezes atingindo a mais de 50 cm de profundidade, ou seja, atingindo além do horizonte superficial Ap (Figura 14), os horizontes BA (Figura 15) e topo do Bw1.

Figura 14 – Torrão de horizonte A compactado de Latossolo Vermelho.
Figura 14 – Torrão de horizonte A compactado de Latossolo Vermelho.

 

Figura 15 - Horizonte BA de Latossolo Vermelho fortemente compactado e horizonte Bw2 com estrutura granular.
Figura 15 - Horizonte BA de Latossolo Vermelho fortemente compactado e horizonte Bw2 com estrutura granular.
 

A formação deste processo na citada bacia acontece, principalmente, pelo trânsito desordenado (Figura 16) e recorrente de máquinas agrícolas, assim como pelo uso inadequado de implementos agrícolas (Figura 17), entre outros fatores.

Figura 16 - Trânsito desordenado em lavoura de soja sobre Latossolo Vermelho.
Figura 16 - Trânsito desordenado em lavoura de soja sobre Latossolo Vermelho.

 

Figura 17 - Uso de grade em solo seco.
Figura 17 - Uso de grade em solo seco.
 

A perda de porosidade por compactação tem sérias implicações ambientais, pois a menor infiltração de água enseja processos erosivos que acabam por descaracterizar os solos de encosta, assorear rios e planícies, além de desconfigurar a dinâmica das nascentes ao final das rampas (Figura 18). Além disto, afetam profundamente a penetração de raízes (Figuras 19 e 20) e a troca gasosa, afetando sensivelmente a produtividade das culturas. Sem dúvida, uma das mais importantes alterações é o fato de que a compactação pode restringir expressivamente a recarga hidrológica dos Latossolos Vermelhos.

 

Figura 18 - Sulco de erosão em rampa convexa-côncava-convergente com assoreamento de nascentes.
Figura 18 - Sulco de erosão em rampa convexa-côncava-convergente com assoreamento de nascentes.
Figura 19 – Forte restrição de desenvolvimento de raiz pivotante por efeito de erosão.
Figura 19 – Forte restrição de desenvolvimento de raiz pivotante por efeito de erosão.

 

Figura 20 - Tombamento de milho em Latossolo Vermelho compactado.
Figura 20 - Tombamento de milho em Latossolo Vermelho compactado.
 

 

Apesar dos novos conhecimentos gerados por pesquisadores/agricultores e muito esforço já ter sido feito no sentido de conservar a estrutura dos solos sob cultivo, sem dúvida a atenção de técnicos e produtores deve ser redobrada afim de se conseguir contornar a situação que ainda persiste nos solos da bacia – a mudança expressiva da estrutura superficial dos solos.

 

 

1 – Pesquisador da Embrapa Florestas – gustavo.curcio@embrapa.br

2 – Pesquisadora da Embrapa Florestas – annete.bonnet@embrapa.br

GALERIA DE IMAGENS

  • Latossolo Vermelho em rampa convexa-retilínea.
     Latossolo Vermelho Eutroférrico típico.
    Presença de encrostamento em Latossolo Vermelho.
     Estrutura granular de horizonte Bw de Latossolo Vermelho.
    Estrutura laminar na superfície de Latossolo Vermelho.
    Boa cobertura de palhada sobre o solo.
    Crosta superficial em Latossolo Vermelho textura muito argilosa.
    Lavoura com pouco resíduo de palhada.
    Estrutura granular de horizonte A de Latossolo Vermelho em floresta nativa.
    Encrostamento superficial com craquelamento radial em Latossolo Vermelho.
    Estrutura compactada de horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
    Estrutura pouco alterada de horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
    Forte compactação do horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
    Torrão de horizonte A compactado de Latossolo Vermelho.
    Trânsito desordenado em lavoura de soja sobre Latossolo Vermelho.
    Uso de grade em solo seco.
    Sulco de erosão em rampa convexa-côncava-convergente com assoreamento de nascentes.
    Forte restrição de desenvolvimento de raiz pivotante por efeito de erosão.
    Tombamento de milho em Latossolo Vermelho compactado.
    Latossolo Vermelho em rampa convexa-retilínea.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Latossolo Vermelho Eutroférrico típico.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Presença de encrostamento em Latossolo Vermelho.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Estrutura granular de horizonte Bw de Latossolo Vermelho.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Estrutura laminar na superfície de Latossolo Vermelho.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Boa cobertura de palhada sobre o solo.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Crosta superficial em Latossolo Vermelho textura muito argilosa.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Lavoura com pouco resíduo de palhada.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Estrutura granular de horizonte A de Latossolo Vermelho em floresta nativa.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Encrostamento superficial com craquelamento radial em Latossolo Vermelho.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Estrutura compactada de horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Estrutura pouco alterada de horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Forte compactação do horizonte A de Latossolo Vermelho sob lavoura.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Torrão de horizonte A compactado de Latossolo Vermelho.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Trânsito desordenado em lavoura de soja sobre Latossolo Vermelho.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Uso de grade em solo seco.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Sulco de erosão em rampa convexa-côncava-convergente com assoreamento de nascentes.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Forte restrição de desenvolvimento de raiz pivotante por efeito de erosão.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
    Tombamento de milho em Latossolo Vermelho compactado.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio
  • Figura 7 - Boa cobertura de palhada sobre o solo.
    Foto: Gustavo Ribas Curcio

    Foto: Gustavo Ribas Curcio