NEOSSOLOS FLÚVICOS NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO IVAÍ - PR

Gustavo Ribas Curcio 1, Verediana Fernanda Cherobim 2

 

Grande parte da Bacia Hidrográfica do Rio Ivaí é recoberta por arenitos da Formação Caiuá, constituída por recorrentes sucessões sedimentares onde a fração areia predomina (Figura 1). Essa composição determina o desenvolvimento de solos arenosos, especialmente, nas classes texturais areia-franca, franco-arenosa e franco-argilo-arenosa (Figura 2), condição que enseja elevado potencial erosional para a região.

 

Figura 1 - Arenito Caiuá - saprolito e Latossolo Vermelho
Figura 1 - Arenito Caiuá - saprolito e Latossolo Vermelho.

 

Figura 2 - Predomínio da fração areia em solos derivados do Arenito Caiuá.
Figura 2 - Predomínio da fração areia em solos derivados do Arenito Caiuá.

 

Decorrente dos processos de elaboração daquelas paisagens (geomorfológicos e pedológicos) (Figura 3), há uma constante migração de sedimentos, especialmente areia das encostas para as planícies, incorrendo na formação de solos que expressam fortemente a referida fração, destaque para o Neossolo Flúvico (RY) (Figura 4) e o Neossolo Quartzarênico (RY).

Figura 3 - Processos erosivos em solos de encosta em área do Arenito Caiuá.
Figura 3 - Processos erosivos em solos de encosta em área do Arenito Caiuá.

 

Figura 4 - NEOSSOLO FLÚVICO Hidromórfico gleissólico psamítico.
Figura 4 - NEOSSOLO FLÚVICO Hidromórfico gleissólico psamítico.

 

O RY é caracterizado por apresentar horizonte superficial (A) sobreposto às camadas, lamelas/lentes, contínuas ou descontínuas, todos de origem fluvial, sem relação pedogenética, identificados por cores e texturas diferenciadas. A formação do horizonte superficial (A) se deve à pigmentação deste pela incorporação de matéria orgânica advinda da vegetação que o sobrepõe (Figura 5), enquanto as variações texturais desse horizonte e das camadas abaixo, estão relacionadas a recorrentes e antigos aportes deposicionais provenientes dos eventos de transbordamento fluvial.

A edificação das camadas resulta de condições intimamente relacionadas, sobretudo, da presença de sedimentos no caudal fluvial, da concentração de energia e da altura deste no momento do transbordamento, assim como da posição em que este solo se encontra na planície. Assim, quanto maior for o grau de energia do caudal fluvial, maior será o incremento de frações mais grosseiras. Contudo, quanto mais distante o solo estiver do leito fluvial, menor oportunidade para chegarem estas frações.

Não raramente, os Neossolos Flúvicos são identificados com a presença de camadas, lamelas/lentes de origem coluvionar, portanto, com características um pouco distintas. Deste modo, conclui-se que os RY são solos minerais que legitimam uma dinâmica fluvial reconstrutiva acelerada, típica dos ambientes de planície, onde encontram-se recondicionadas intimamente deposições aluvio/coluvionares.

Nos planos aluvionares estes solos podem ser encontrados em diferentes posições, tanto em margens de rios, como mais internamente, em zonas próximas da transição para a encosta, dependendo do tempo de migração do leito fluvial.

Podem ou não apresentar feições gleizadas, retratando ambientes com diferentes graus de anoxia, fruto da constância e altura do lençol freático em sua formação.

Os recentes depósitos de planície fluvial sobre solos antigos da planície (sotopostos), guardam características muito distintas desses, pois esses tiveram sua evolução em ambientes com a presença de caudais fluviais de baixa energia, em função do recobrimento florestal total da região, outrora existente. Com a substituição da floresta dos solos de encosta (Figura 6) por sistemas produtivos mal manejados (Figura 7), iniciaram-se fortes processos erosivos, os quais submetem às planícies picos de vazões exponenciais (Figura 8), carreando níveis de sedimentos muito superiores ao passado.

Figura 5 - Floresta fluvial sobre Neossolo Flúvico
Figura 5 - Floresta fluvial sobre Neossolo Flúvico.

 

 

Figura 6 - Dossel da Floresta Estacional Semidecidual.
Figura 6 - Dossel da Floresta Estacional Semidecidual.

 

 

Figura 7 - Sistemas de produção mal manejados com subsquente processo erosivo.
Figura 7 - Sistemas de produção mal manejados com subsquente processo erosivo.

 

 

Figura 8 – Alterações dos picos de vazão dos rios proporcionado pela troca de cobertura do solo.
Figura 8 – Alterações dos picos de vazão dos rios proporcionado pela troca de cobertura do solo.

 

Este processo está retratado na Figura 9 onde é possível observar duas fases distintas: uma fase deposicional superior com aproximadamente 70 cm de espessura, constituída por sedimentos albinizados (brancos), com textura areia, assente em camada pretérita rica em matéria orgânica. Esta, por sua vez, encontra-se sobre camada gleizada, com textura franco-argilo-arenosa constituindo, assim, mais uma evidência da profunda alteração da energia do caudal fluvial. Certamente, o solo sotoposto era um antigo “Gleissolo Melânico”, naquela ocasião formado pelos horizontes proeminente (A) e o horizonte glei (Cg).

 

Figura 9. NEOSSOLO FLÚVICO Distrófico gleissólico fase soterrada.
Figura 9 - NEOSSOLO FLÚVICO Distrófico gleissólico fase soterrada.

 

 

A fase álbica, em última análise, atesta processos abomináveis como a elevada energia dos caudais fluviais atuais que impedem a deposição de coloides ou, ainda, que as deposições possuam uma recorrência de tempo muito estreita, a ponto de impedir a pigmentação dos sedimentos por matéria orgânica, subsequentemente, a formação do horizonte A. Cabe salientar que a presença de coloides no solo é um dos maiores, senão o maior, patrimônio de uma nação, por todo o complexo de reações benéficas ambientais proporcionado.

Concomitantemente, depreende-se que o “Gleissolo Melânico” possuía horizonte superficial espesso e rico em matéria orgânica, advinda da biomassa dos ambientes florestais de outrora. Mais que isso, certamente, o caudal fluvial fluía com baixos níveis de energia, processo que favorecia o acúmulo de coloides no solo.

Por estas e por outras razões, o estudo dos solos de planície, suas composições e atributos, torna-se elemento fundamental para o perfeito entendimento do uso e do manejo atribuídos aos solos de encosta.

 

 1 – Pesquisador da Embrapa Florestas – gustavo.curcio@embrapa.br

2 – Técnica da FAPED – verediana.cherobim@gmail.com